quarta-feira, outubro 03, 2007

A fé solúvel

É, me esqueci da luz da cozinha acesa
de fechar a geladeira
De limpar os pés,
Me esqueci Jesus!
De anotar os recados
Todas janelas abertas,
onde eu guardei a fé... em nós


Meu café em pó solúvel
Minha fé deu nó
Minha fé em pó solúvel

É... meu computador
Apagou minha memória
Meus textos da madrugada
Tudo o que eu já salvei
E o tanto que eu vou salvar
Das conversas sem pressa
Das mais bonitas mentiras
Hoje eu não vivo só... em paz

Hoje eu vivo em paz sozinho
Muitos passarão
Outros tantos passarinho

Que o teu afeto me afetou é fato
Agora faça me um favor
Um favor... por favor

A razão é como uma equação
De matemática... tira a prática
De sermos... um pouco mais de nós!

Que o teu afeto me afetou é fato
Agora faça me um favor
Um favor... por favor
[[o teatro mágico]]

quinta-feira, agosto 23, 2007

Obrigado, violinos



Obrigado, violinos
Por este dia de quatro cordas
É puro o som do céu
E a voz azul do ar.


[[Pablo Neruda - Obrigado, violinos]]

quarta-feira, agosto 22, 2007

Eu...



Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada ... a dolorida...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!
[[Florbela Espanca]]

domingo, agosto 19, 2007

Versos Íntimos


Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!


Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo amigo é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
[augusto dos anjos - eu]

terça-feira, junho 26, 2007

trecho

Agora eu conheço esse grande susto de estar viva, tendo como único amparo exatamente o desamparo de estar viva. De estar viva - senti - terei que fazer o meu motivo e tema. Com delicada curiosidade, atenta à fome e à própria atenção, passei então a comer delicadamente viva os pedaços de pão.

[C.L.]

quinta-feira, março 22, 2007

gritos incendiários

Da masmorra de um domingo vadio
Ouço as paredes a me provocar
e o barulho do silêncio em minha alma
Ecoa veneno

Da masmorra de um domingo vadio
O que não fui está à minha espera
Gastando em tragos a minha vida
Soprando-me a morte

"Pele gasta, ossos frágeis
meus olhos contemplam apenas a decomposição de minha própria existência.
Pele gasta, vida frágil
e tudo, quase tudo parece ter perdido a razão de ser.
A morte escapara pela diagonal.
Vida frágil, existência gasta,
o espelho reflete hoje apenas o desperdício de mim
uma vida que já se foi.

Madrugada
o silêncio das paredes em minha volta
ja não choro pela ausência daqueles que amei
ja não dói o esquecimento dos que me acompanharam
e me abandonaram
hoje é outra vida em mim que o espelho reflete
envelheço
acostumado com a solidão em que me deixaram"


E eu
A correr sobre os corpos do que passou
E à sombra do capataz
E eu a cavar as lembranças na cova da solidão
Apostando e perdendo pro tempo a seiva da alma

Dos destroços de um domingo vazio
A brisa da morte me espia
Erguendo sua foice em meu caminho
Rasgando-me a face

Dos destroços de um domingo vazio
Eu num cárcere de retalhos
Sob o preço e a pena de ter sido apenas
O que quase fui


[[sistema límbico]]